2009/08/31

"It is a rough road that leads to the heights of greatness. - Esburacada é a estrada que leva a mais alta grandeza." - Star Wars: The Clone Wars

   
    Já são três horas da manhã. A chuva definitivamente não vai cessar, a noite parece nunca acabar e talvez o dia de amanhã não chegue para mim. A esperança de alguma ajuda deveria ser o último pensamento à se perder... contudo parece próxima a saída deste último fio de minha mente. Talvez por este acompanhar a saída do último fio de vida do meu corpo.
    Não tenho mais medo do que pode vir ou, talvez, não vir. Se amanhã tudo acabar, terei feito minha obra. Se amanhã a vida continuar, estarei seguindo meu caminho. O medo não persegue mais a minha mente e, assim, torna-me mais suscetível a morte.
...
    Seis horas depois do desmoronamento Carlos foi encontrado vivo. Seus relatos são suficientes para escrever todo um livro. Para ele, aquelas seis horas foram suficientes para preencher por vários anos toda a sua vida.

2009/08/24

Hoje vou publicar algo diferente: um trecho de uma longa conversa sobre volúpia corporal minha com um amigo meu. Apreciem com moderação.


Diogo,

    "Eu sou um devoto do dharma, e um seguidor do Buda
Shakyamuni. Dentro do ensinamento dele, ele deixou claro que nossa
mente não é dimensionada para experimentar a realidade como na
realidade costuma experimentar, e por isso sofremos muito.

    O que ele quis dizer é que sexo não é problema, que o contato e a
experiencia corporal não é errado. Mas pensar que o corpo, elemento
transitório e impermanente é fonte de felicidade e sabedoria duradouras
é pensar que uma labareba na palha pode aquecer para sempre. Antes,
ensinava ele, é preciso se desvencilhar dos apegos e da sensualidade
excessiva para desfrutar da real vivência do amor. E sim, preguem o que
pregarem, amor existe e sexo deve fazer parte do pacote. Eu vivo
errado, pois vivo na outra margem e contrario ao ensinamento que me
propus a seguir ao fazer isso, mas sei que o faço por ignorância, e
principalmente por ignorância da falta de autoconhecimento. Repudia a
qualquer coisa constitui tb um apego ao qual renunciar, entende? E esta
repúdia ao calor humano eu devo vencê-la, pois não se vive sem calor e
amor.

    Se você me perguntar hoje, o que penso de fato sobre a experiencia
corporal eu diria "Não sei, Diogo...", pois pensaria que "Não sei de
fato o que é o corpo... onde ele começa e termina, onde ele traz
experiencias e como traz...", e concluiria "preciso aprender isso...".

    Sei que você diria "comece deixando de ser teimoso..." e eu diria "preciso me conhecer melhor, e estou me esforçando..."
    Porque no fim, também quero ser feliz. Mesmo que eu ainda não saiba o que signifique "ser feliz"."

2009/08/17

    Impressionava-me como as pessoas insistiam em reparar a velocidade do tempo. Hoje a noite foi rápida, nossa tarde está demorando, que manhã lenta... e assim iam os pensamentos perseverantes do povo em medir a passagem do tempo levados pela intensidade de seus sentidos.

    Em fim, rápido ou não o nascer do sol não poderia ser mais surpreendente hoje. Talvez este seja o ducentésimo que vejo este ano, contudo, ainda é surpreendente.
    Os tons de vermelho e dourado misturando-se aos montes no horizonte, as sombras como o fim de um manto escorrendo e desaparecendo na presença do portador de toda energia que prove vida e, por fim mas não menos importante, um insignificante eu sentado em uma pedra fumando um cigarro.

    Geralmente vivemos muitas noites durante a vida, muitos dias e muitas tardes. E geralmente também desfrutamos muito pouco dos mesmos dias, tardes e noites. Talvez por não saber como desfrutar, por não querer, por não conseguir, por não poder... e assim gastamos mais tempo reclamando do que não fazemos do que realmente procurando fazer algo.
 
    Tenho quarenta e sete anos e, proporcional a minha idade, vi poucos nasceres de sol. Entretanto os desejei, busquei e vi; mesmo que para isso tivesse que abrir mão de muitos pores de sol.

2009/08/12

"I came to deliver bad luck to you! - Eu vim para entregar má sorte a você!"
Black Cat

    Talvez, somente talvez, aquele poderia realmente ser um dia de má sorte para Laura, se ela realmente acreditasse em sorte. Para ela uma seqüência de acontecimentos desagradáveis é somente uma seqüência de escolhas erradas. Certamente muitas dessas escolhas podiam não acontecer na sua vida, ela pensava, mas na vida de pessoas que iriam fazer diferença no desenrolar dos fatos. Em fim, ela não acreditava ter pleno domínio dos acontecimentos mas também não acreditava em coincidências, sorte ou azar.
    No entanto a sua seqüência de escolhas, dizendo em sua forma de pensar, naquele dia realmente foi um desastre. O salto alto quebrado ao descer do carro, sorvete derramado na jaqueta, lente de contato caindo no ralo... e, quem sabe, muita pimenta na comida em um dia com afta possa ser incluído nessa lista.
    Laura conseguiu voltar para casa, sem nenhum arranhão, e, espetacularmente, sem desejar o fim do dia, ou do mundo, como a maioria das pessoas faz.
    Abriu a janela do quarto, observou uma lua mais brilhante que o normal e repentinamente decidiu ligar para seu vizinho do andar de cima.
    _ João, tudo bem por ai?
    _ Tudo La. Estava aqui vendo a lua e pensando que dia vamos tomar aquele vinho.
    _ Bem, se puder ser hoje eu iria adorar.
    _ Então eu te vejo daqui quarenta minutos ok?
    _ Ok, beijos.
    Nesse momento, ao desligar o telefone, ela para e olha uma mensagem do dia de seu calendário: "humor não é estado de espírito mas sim um ponto de vista". Então enquanto pensava em qual lingerie iria usar ela ria sozinha ao retomar a confiança em suas decisões.
    E assim terminou o quase, somente quase, dia de azar de Laura.

2009/08/06


    O texto abaixo é uma brincadeira, um conjunto de impressões retiradas de algumas apresentações vistas em uma noite na academia Pé-de-Valsa. Foi uma experiência divertida. Se fosse um quadro, provavelmente seria um horizonte com o sol e a lua.

...

    Tudo era silêncio. Tensões e fluxos de calor passavam de uma forma peculiar. O destino mostrou-me um momento diferenciado.
    Ali, enquanto estava sentado, aguardava acontecimentos que não sabia como seriam. Começava a brotar de minha cabeça pelos meus ouvidos, como bolhas de sabão, pequenas pessoas de aparências diferentes. Eram manifestações de minhas percepções.
    Uns pareciam mais como observadores comuns, outros mais cômicos e com formas desproporcionais e ainda alguns como personagens clássicos do mundo: o malandro, o dançarino ou o garçom.
    E, enquanto tranquilo aguardava, tais entes diversos já fofocavam opiniões em meus ouvidos como diabos e anjinhos particulares.
    Repentinamente, luzes surgiram como velas em minha frente: o brilho do seu corpo ondulava com o calor dos pensamentos.
    _Quem é você corpo tremeluzente que paira como uma chama diante de mim?
    _Eu sou o dissipar da paixão e o sopitar da alegria que brotam na escuridão da noite. - Assim narravam meus sentidos companheiros e perceptivos em meus ombros.
    _Alegria!
    A felicidade transformara-se em um olhar malandro do homem e sua expressão no samba.
    _Ei, vê? Ai está a verdadeira malandragem que fomenta a felicidade de viver a dois.
    _Mas eu sou mineiro rapaz! E minha felicidade a dois não é malandragem mas a pureza do desejo que surge no primeiro olhar.
    No meio daquela discussão ferrenha percebi algo que até então não sabia: opiniões da consciência podiam ter diversas personalidades.
    _Mas o amor de verdade não são somente corpos ardentes. O amor de verdade vive sozinho, transpira e morre como o orvalho da manhã.
    _Contudo o poder da serpente e a sedução da alma é algo real e concreto. Quem você ama é, quem você quer é, respostas que nem sempre andam acompanhadas.
    _Eu sou a mulher de verdade, a dama do samba que rouba seu coração. Não me importa a quem você pertence, eu te desejo e por isto vou te ter!
    Agora sim tinha certeza, ali, sentado na mesa, que minha cabeça havia virado um botequim! Para de mineiro a carioca, santas a peruas, opinarem ao mesmo tempo naquele interim eu realmente deveria estar em alguma cafeteria underground ou aquele show que presenciava ligou alguma chave distante em minha cabeça.
    _Sim, você é meu. Com poucos traços em poucas curvas, conquisto todos os pensamentos de sua mente. Não vai amar, desejar ou pensar em mais nada ou ninguém. Somente eu e meu calor, o seu espírito vai sentir, Fecha os olhos e entra no paraíso.
    _Não mulher, o amor real é único e eterno. Seja através do tempo ou do destino, seja o encontro incomum ou insólito, o meu amor real sempre será por você.
    Cansado de tal caótica discussão guardei meu caderno de anotações no bolso e, junto com o desaparecimento dele, todas aquelas visões apagaram-se ao redor de mim. Certamente era mais seguro e tranqüilo viver somente com a minha mais sincera percepção e opinião. Qual ela era? Ah, isso fica para ser contado outro dia.